Descumprimento de norma coletiva x Tema 1..046 STF: TST afasta condenação ao pagamento de horas extras.

O Tribunal Superior do Trabalho, ao julgar o recurso de revista interposto por empresa do segmento ferroviário, excluiu a condenação ao pagamento de horas extras e reflexos, manifestando o entendimento de que eventual descumprimento de norma coletiva, por si só, não é causa apta a ensejar a sua nulidade.

No caso em questão, a norma coletiva aplicável ao empregado estabelecia o labor em turnos ininterruptos de revezamento de 8 horas diárias e 44 horas semanais, todavia o reclamante ingressou com reclamação trabalhista requerendo a nulidade da cláusula normativa, em razão da realização de horas extras habituais e, consequentemente, o recebimento de horas extras a partir da 6ª diária/36ª semanal

O Tribunal Regional do Trabalho manteve a sentença que condenou a empresa ao pagamento das horas extras na forma requerida pelo reclamante, sob o argumento de que, em que pese o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido a validade de norma coletiva que restrinja direito trabalhista não assegurado constitucionalmente (Tema 1.046), o labor em jornada diária, de forma habitual, superior à autorizada no Acordo Coletivo – 8 horas diárias – enseja o pagamento da 7ª e 8ª horas, nos termos do artigo 7º, XIV, da Constituição Federal.

Ao apreciar o recurso de revista, no entanto, o Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a transcendência jurídica da controvérsia, vez que o decisum foi contrário ao Tema 1046, de natureza vinculante e, no mérito, afastou a condenação ao pagamento de horas extras.

O entendimento do TST foi acertado, sob o nosso ponto de vista, vez que está em absoluta sintonia com a tese de repercussão geral fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1046, destacando-se que no julgamento do referido tema, há previsão expressa quanto à possibilidade de prorrogação da jornada realizada em turnos ininterruptos de revezamento:

“Assim, ainda que de forma não exaustiva, entendo que a jurisprudência do próprio TST e do STF considera possível dispor, em acordo ou convenção coletiva, ainda que de forma contrária a lei sobre aspectos relacionados a: (i) remuneração (redutibilidade de salários, prêmios, gratificações, adicionais, férias) e (ii) jornada (compensações de jornadas de trabalho, turnos ininterruptos de revezamento, horas in itinere e jornadas superiores ao limite de 10 horas diárias, excepcionalmente nos padrões de escala doze por trinta e seis ou semana espanhola).” (ARE 1121633 / GO – Tema nº 1046 do STF, Relator Ministro Gilmar Mendes – DJ Nr. 90 do dia 28/04/2023 – destacou-se)

Como bem salientado no acórdão, o próprio Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 1.476.596/MG, decidiu que o eventual descumprimento de norma coletiva, por si só, não é fundamento para a sua nulidade, o que somado aos fundamentos retro expostos, levou o TST a reconhecer a violação ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal e julgar improcedentes os pedidos de horas extras.

O entendimento manifestado pelo Tribunal Superior do Trabalho é de extrema relevância, ao passo em que, além de cumprir a sua função uniformizadora face às decisões proferidas pelos Tribunais Regionais que estão negando eficácia ao Tema 1046, corroborou a observância ao princípio da autonomia privada coletiva, prestigiando a negociação coletiva, instituto de suma importância nas relações trabalhistas.

Processo: 1000216-08.2022.5.02.0481

Flávia Ramalho

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