Em abril de 2025, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) publicou a segunda edição da Pesquisa de Equidade de Gênero no Setor Aquaviário (PEG 2024). Em um setor historicamente masculino, os dados revelam avanços importantes e reforçam o potencial de transformação por meio de políticas inclusivas.
A pesquisa aponta que as mulheres representam 17,8% do total de trabalhadores no setor portuário brasileiro, um crescimento de 0,5 em relação a 2022. Esse aumento pode parecer modesto, mas manter o ritmo de crescimento é fundamental.
Distribuição por Cargo: Avanços e Potencial de Expansão
- Direção: 15% mulheres (leve queda em relação a 2022, quando eram 16,7%)
- Gerência: 25% mulheres (crescimento em relação aos 22,5% registrados na edição anterior)
- Operacional: 10% mulheres (área com maior potencial de expansão)
- Administrativo: 40% mulheres (concentração significativa em funções de suporte)
Os números mostram que, mesmo em áreas tradicionalmente dominadas por homens, as mulheres estão conquistando espaços. O desafio agora é garantir que esse movimento seja contínuo e sustentável, sobretudo em cargos estratégicos e funções operacionais.
A pesquisa também trouxe um panorama detalhado da participação feminina por subsetor, evidenciando setores onde as mulheres já ocupam posições estratégicas e áreas que oferecem grandes oportunidades de crescimento:
- Autoridades Portuárias: 26,3% em todos os cargos | 16,6% em cargos de direção
- Cabotagem de Contêineres: 31,3% em todos os cargos | 23,6% em cargos de direção (melhor desempenho entre os subsetores)
- Navegação Interior: 5,6% em cargos operacionais | 10,1% em cargos de direção (segmento com maior potencial para políticas inclusivas)
O setor de Cabotagem de Contêineres desponta como um exemplo de boas práticas, apresentando a maior proporção de mulheres em cargos de direção e no quadro geral. Esse resultado reforça a importância de políticas ativas de inclusão e promoção feminina.
Já a Navegação Interior ainda possui índices reduzidos, mas também configura uma grande oportunidade para ações direcionadas, sobretudo em cargos técnicos e operacionais.
A pesquisa também trouxe um alerta positivo: as mulheres jovens estão entrando no setor em maior número, mas é essencial garantir a permanência dessas profissionais ao longo da carreira.
Faixa Etária. Participação Feminina (%). Participação Masculina (%)
18 a 24 anos 33,5% 66,5%
25 a 44 anos 19,4% 80,6%
45 a 54 anos 12,2% 87,8%
55 anos ou mais 8,3% 91,7%
A partir dos 45 anos, a participação feminina cai significativamente, o que indica um potencial de perda de talentos experientes. Manter essas profissionais no setor é fundamental, e ações como capacitação contínua, programas de mentoria e políticas de conciliação trabalho-família podem ser grandes aliados.
Além do setor regulado, a pesquisa analisou a composição de gênero dentro da ANTAQ e do MPOR, reforçando a importância de que os próprios órgãos públicos atuem como agentes de mudança. Embora os números ainda estejam abaixo do ideal, a ANTAQ vem promovendo ações para fortalecer a presença feminina, sobretudo em cargos estratégicos, e integrar a agenda ESG ao planejamento institucional. Nessa mesma direção é a Portaria nº 58/2025/MPOR, que estabelece incentivos para Políticas de Sustentabilidade/ESG, divididos em quatro níveis Bronze, Prata, Ouro e Diamante. As empresas que adotarem políticas de equidade de gênero terão benefícios que incluem:
- Prioridade em concessões e renovações contratuais, especialmente para empresas com 30% ou mais de mulheres em cargos de liderança;
- Pontuação adicional em processos licitatórios de arrendamento portuário;
- Acesso facilitado a linhas de crédito oficiais vinculadas ao ESG.
Essa iniciativa do MPOR representa um grande avanço para a equidade de gênero. Para conquistar o Selo Diamante, as empresas precisam publicar o Relatório de Transparência Salarial, em conformidade com a Lei nº 14.611/2023 (Lei de Igualdade Salarial entre Mulheres e Homens). Além disso, organizações que não apurarem denúncias de assédio serão inelegíveis para a certificação.
Esses incentivos transformam a equidade em diferencial competitivo, criando um ciclo virtuoso de inclusão e crescimento sustentável.
Os dados são um retrato encorajador de um setor em transformação, onde os avanços, ainda que graduais, indicam um movimento consistente em direção à equidade.
Manter a trajetória ascendente é fundamental, sobretudo em um setor onde a presença feminina sempre foi limitada. Por isso, ações estratégicas são essenciais para:
- Aumentar a presença feminina em cargos técnicos e operacionais, aproveitando os incentivos da Portaria do Ministério de Portos e Aeroportos – MPOR nº 58/2025;
- Fortalecer a retenção de mulheres 50+, com programas de mentoria e políticas de conciliação;
- Utilizar os selos MPOR como alavanca para a transformação cultural, promovendo a equidade não apenas como um objetivo social, mas como um ativo estratégico.
Não há espaço para retrocessos. O setor aquaviário brasileiro está em um momento único, com políticas públicas alinhadas às melhores práticas ESG. A manutenção do crescimento feminino, especialmente em cargos estratégicos, é um passo fundamental para garantir um setor mais inclusivo, competitivo e sustentável.
Para acessar os dados completos da pesquisa, acesse o painel interativo da PEG 2024: web3.antaq.gov.br/ea/peg
Flávia Sammarco – sócia do Sammarco Advogados e Diretora de ESG da OAB/Santos